Da inconstitucionalidade da expressão “será considerada não declarada a compensação”, constante do § 12 da Lei n.º 9.430/96 e da totalidade do § 13 do mesmo diploma legal
Os §§ 9.º ao 13 do  artigo 74, da Lei n.º 9.730/96, in verbis:
“Art. 74. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão.
(...)
§ 9.º É facultado ao sujeito passivo, no prazo referido no § 7.º, apresentar manifestação de inconformidade contra a não-homologação da compensação.
§ 10. Da decisão que julgar improcedente a manifestação de inconformidade caberá recurso ao Conselho de Contribuintes.
§ 11. A manifestação de inconformidade e o recurso de que tratam os §§ 9.º e 10.º obedecerão ao rito processual do Decreto no 70.235, de 6 de março de 1972, e enquadram-se no disposto no inciso III do art. 151 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, relativamente ao débito objeto da compensação.
§ 12. Será considerada não declarada a compensação nas hipóteses:
(...)
II - em que o crédito:
- seja de terceiros;
 - refira-se a "crédito-prêmio" instituído pelo art. 1.º do Decreto-Lei n.º 491, de 5 de março de 1969;
 
(...)
§ 13. O disposto nos §§ 2.º e 5.º a 11 deste artigo não se aplica às hipóteses previstas no § 12 deste artigo.
(Lei  n.º 11.051/04, D.O.U de 30/12/2004)”
A previsão legal,  suso transcrita, dos parágrafos 12 e 13, do artigo 74, da lei n.º  9.430/96, com redação dada pela Lei n.º 11.051/04 não devem prevalecer  no mundo jurídico, sob pena de ofensa aos incisos XXXIV, LIV e LV,  do artigo 5.º e § 4.º, inciso IV, do artigo 60, todos da Constituição  Federal, como veremos.
Ao simplesmente considerar  como NÃO DECLARADA à compensação transmitida pelo contribuinte,  com base no caput do § 12, da Lei n.º 9.430/96, a Autoridade  Fiscal ceifa o direito de petição previsto no artigo 5.º, inciso  XXXIV da Constituição Federal, pois, pela previsão legal, verifica-se  que o interessado sequer terá direito a questionar o enquadramento  de seu crédito nas hipóteses previstas no malfadado inciso II, do  § 12, do artigo 74, da Lei n.º 9.430/96, pois sua declaração é  simplesmente desconsiderada, como se não tivesse existido.
Da mesma forma, ao excetuar  a aplicação dos parágrafos 9.º ao 11 da Lei n.º 9.430/96, aos casos  em que a compensação é desconsiderada (§ 13, da Lei n.º 9.430/96),  a União retira do contribuinte o direito à “manifestação de  inconformidade”, ficando o mesmo sem nenhum direito de defesa  com eficácia suspensiva na esfera administrativa, em total afronta  direta ao artigo 5.º, incisos LIV e LV, ambos da Constituição Federal.
Os incisos XXXIV, LIV  e LV, do artigo 5.º, todos da Constituição Federal, in verbis:
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
(...)
XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
(...)
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
Se é assegurado pela  previsão Constitucional o direito de petição aos poderes públicos  em defesa de direitos, bem como que a ninguém deve ser privado de seus  bens sem o devido processo legal, sendo assegurado aos litigantes em   processo administrativo o contraditório e a ampla defesa, com os meios  e recursos a ela inerentes, então a atitude de simplesmente desconsiderar  a Declaração de Compensação dirigida ao ente fiscal e encaminhar  diretamente para cobrança e inscrição em Dívida Ativa, os débitos  declarados como compensados, sem permitir qualquer espécie de manifestação  do contribuinte e ainda aplicando ao mesmo multas em cifras que variam  de 75% (setenta e cinco por cento) a 150% (cento e cinqüenta por cento)  sobre o valor compensado, é ato atentatório contra os seus direitos  fundamentais.
Acaso fundado em lei,  então tal previsão legal é flagrantemente inconstitucional, pois  existem regras em nossa Carta Magna que são inalteráveis, essas regras  são chamadas Cláusulas Pétreas, e estão protegidas pela disposição  do parágrafo 4.º, do artigo 60, verbis:
“§ 4.º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
(...)
IV  - os direitos e garantias fundamentais.”
A ampla defesa e o contraditório  na esfera administrativa, bem como o direito de petição, estão incluídas  nos direitos e garantias fundamentais dos contribuintes, qualquer expressão  ou dispositivo tendente a abolir ou limitar tais direitos devem ser  extirpados dos textos legais.
Verifica-se a total  falta de conformação constitucional da expressão “será  considerada não declarada a compensação” prevista no § 12  da Lei n.º 9.430/96, por afrontar o direito de petição, e, via de  conseqüência, ceifando o direito à ampla defesa e ao contraditório  na esfera administrativa previsto no art. 5.º, incisos LIV e LV da  Constituição Federal, frente a previsão do § 13, do mesmo diploma  legal, acrescentados pela Lei n.º 11.051/04.
Tais previsões legais  retiram o direito à “manifestação de inconformidade” do  contribuinte, recurso dotado de eficácia suspensiva do crédito tributário  discutido ex vi do artigo 151, III, do CTN, configurando verdadeiro  instrumento coativo de cobrança aos contribuintes que inviabiliza a  regular continuidade das atividades empresariais.
Nesse aspecto, também  é certo que a Lei n.º 11.051/04 (D.O.F.C de 30/12/2004), não poderia  ter limitado o espectro de abrangência da suspensão da exigibilidade  conferida aos débitos objeto de pedidos de compensação feitos às  autoridades administrativas, para excluir desse universo aqueles ainda  não inscritos em Dívida Ativa ou que já estavam em andamento antes  de sua entrada em vigor.
Isto porque, sendo a  suspensão da exigibilidade do crédito tributário matéria reservada  à Lei Complementar (Código Tributário Nacional) não poderia a Lei  Ordinária ou qualquer outro ato infra-legal dispor em sentido contrário.  Vejamos interessante julgado sobre o tema, verbis:
“(...) LIMITAÇÃO DE DIREITO DO CONTRIBUINTE PREVISTO NO ART. 151, III, CTN. OFENSA AO PRINCÍPIO DE HIERARQUIA DAS NORMAS.
- O art. 151, III, do Código Tributário Nacional dispõe que ‘as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo, suspendem a exigibilidade do crédito tributário administrativo’. Portanto, diante da natureza de Lei Complementar do Código, hierarquicamente superior às demais normas legislativas, à exceção da Emenda Constitucional, não pode legislação inferior limitar ou condicionar a eficácia de hipótese de suspensão de exigibilidade do crédito tributário. A segunda parte do inciso em comento, ao se referir a leis reguladoras, não autoriza, como se sabe, a que se inove na matéria. A regulamentação apenas deve explicitar o direito garantido ao contribuinte, e nunca limitá-lo, o que só poderia ser providenciado por norma processada na forma de lei complementar.
- Recurso improvido.”
(TRF  2.ª, AMS n.º 2001.02.01.014941-7/RJ, 4.ª Turma, Des. Luiz Fernando  Marques, Rel, Convocada Juíza Lana Regueira, julgado em 20/06/2001,  DJU 21/08/2001 – Grifamos  )
A Relatora no acórdão  suso ementado, Juíza Federal Convocada Lana Regueira, do TRF 2.ª  Região, ao negar provimento ao recurso da Fazenda Nacional, no julgamento  da Apelação em Mandado de Segurança n.º 2001.02.01.014941-7 (DJ  de 21/08/2001, pg. 110), analisa a questão de violação ao Princípio  da Hierarquia das Normas. 
Na medida em que o art.  151, III, do Código Tributário Nacional dispõe que “as reclamações  e os recursos, nos termos da leis reguladoras do processo tributário  administrativo, suspendem a exigibilidade do crédito tributário administrativo”  e, diante da natureza de Lei Complementar do Código, hierarquicamente  superior às demais normas legislativas, à exceção da Emenda Constitucional,  não poderia legislação inferior limitar ou condicionar a eficácia  de hipótese de suspensão de exigibilidade de crédito tributário,  pois a segunda parte do inciso em comento, ao se referir a leis reguladoras,  não autoriza, como se sabe, a que se inove na matéria. A regulamentação  apenas deve explicitar o direito garantido ao contribuinte e nunca limitá-lo,  o que só poderia providenciado por norma processada na forma de lei  complementar.
Sendo assim, a Lei n.º  11.051/04, por ser lei ordinária, não poderia ter limitado o espectro  de incidência do artigo 151, III, do CTN, por ser norma hierarquicamente  inferior, muito menos vir a possibilitar que a fiscalização simplesmente  desconsidere os pedidos administrativos em determinadas hipóteses.
Como visto, o mero enquadramento  fiscal de que a compensação levada a termo pelo contribuinte estaria  vedada em lei, o autoriza a repugnar o pedido formulado, tratando como  correto o ato administrativo que considera não declarada a compensação  com base no §12, do artigo 74, da Lei n.º 9.430/96 e, com base no  §13, do mesmo diploma. Não bastasse isso, na hipótese é permitido  ao fiscal excetuar tais casos da aplicação do direito a eficácia  suspensiva inerente à manifestação de inconformidade.
Apesar da disposição  clara dos preceitos trazidos pela Lei n.º 11.051/04, por mais absurda que possa parecer  a pretensão compensatória apresentada pelo contribuinte, entendemos  que não poderia ser negado a ele o direito a ampla defesa e ao contraditório,  com a fruição de todos os recursos inerentes aos postulados invocados,  como a suspensão inerente ao recurso administrativo que acabou tendo  sua hipótese excetuada pela previsão do artigo 4.º, da Lei n.º 11.051/04,  a qual acrescentou os §§ 12 e 13, ao artigo 74, da Lei n.º 9.430/96,  tal previsão legal é flagrantemente inconstitucional, pois existem  regras em nossa Carta Magna que são inalteráveis.
Em sendo assim, contamos que o E. STF, ante aos diversos casos e precedentes que deverão seguir ao seu julgamento a respeito da matéria, deverá, através de seus ilustres integrantes, conhecer dos argumentos apresentados e dar-lhes provimento, para que seja declarada a inconstitucionalidade dos §§ 12 e 13, ambos do artigo 74, da Lei n.º 9.430/96, com redação dada pelo artigo 4.º, da Lei n.º 11.051/04, por contrariarem a Constituição Federal, conforme demonstrado e em exemplar manutenção dos direitos fundamentais dos contribuintes.
Autor: Alexandre Roehrs Portinho (alexandre.portinho@terra.com.br)
Advogado e Contabilista, Especialista em Direito Tributário, Financeiro e Econômico pela UFRGS, sócio da HOMRICH PORTINHO ADVOCACIA EMPRESARIAL S.S. e consultor da GESTÃO TRIBUTÁRIA CONSULTORIA EMPRESARIAL LTDA.
http://lattes.cnpq.br/2429461568270567
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