sábado, 31 de janeiro de 2009

Artigo: Ilegalidade da Compensação de Ofício com valores objeto de Parcelamento

Muitos contribuintes têm pleiteado a restituição de créditos perante a Receita Federal do Brasil, porém, ao obter o reconhecimento de seu crédito, não raras vezes a fiscalização determina que o valor do crédito reconhecido será compensado com débitos existentes em seu nome e, em havendo discordância com tal procedimento, a Unidade da Secretaria da Receita Federal do Brasil reterá o valor da restituição ou ressarcimento até que sejam liquidados os débitos, com base no artigo 6.º, § 3.º, do Decreto n.º 2.138/97.

Realmente a previsão legal é clara, existe essa possibilidade de retenção do valor até liquidação dos débitos ou, o aceite a promoção da compensação de ofício, porém, a única espécie de débito para com a Fazenda Nacional passível de compensação de ofício com créditos de que seja titular o contribuinte, são aqueles que estejam com sua exigibilidade ativa, pois os que estiverem com sua exigibilidade suspensa face a pendência de julgamento definitivo ou parcelamento ex vi dos incisos III e VI, do artigo 151, do CTN não podem ser objeto do instituto fim de reduzir o crédito a ser restituído ao contribuinte.

E aí é que começam os problemas, pois a SRFB normalmente pretende compensar o saldo de crédito com valores incluídos em parcelamentos ou em discussão administrativa. Não podemos considerar o contribuinte em débito enquanto estiver suspensa a exigibilidade do crédito tributário. A existência do “débito” é pressuposto básico de incidência da previsão legal em que se fundamenta a compensação de ofício, para dar respaldo à legalidade do ato administrativo, porém, estando suspensa em sua exigibilidade, não pode ocorrer a compensação de ofício do pretenso débito. Nesse sentido é a orientação jurisprudência do STJ, in verbis:

          “TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO PELA SECRETARIA DE RECEITA FEDERAL DE VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE A TÍTULO DE PIS A SEREM RESTITUÍDOS EM REPETIÇÃO DE INDÉBITO, COM VALORES DOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS CONSOLIDADOS NO PROGRAMA REFIS. IMPOSSIBILIDADE. OPÇÃO DO CONTRIBUINTE. ART. 163 DO CTN. NÃO-APLICAÇÃO.

          1. Afasto a alegada violação ao art. 535, II, do Código de Processo Civil, uma vez que o acórdão guerreado se pronunciou de forma clara e suficiente sobre as questões que lhe foram apresentadas, ainda que de forma contrária às pretensões da recorrente.

          2. Não é necessária a expressa alusão às normas tidas por violadas, desde que o aresto guerreado tenha se manifestado, ainda que implicitamente, sobre a tese objeto dos dispositivos legais tidos por violados, no caso dos autos, os arts. 7º, caput, e § § 1º e 2º, do Decreto-Lei nº 2.287/86 e 163 do Código Tribunal Nacional.

          3. Esta Corte vem adotando entendimento no sentido de não ser possível que a Secretaria de Receita Federal proceda à compensação de ofício de valor a ser restituído ao contribuinte em repetição de indébito, com o valor do montante de débito tributário consolidado no Programa REFIS, visto que os débitos incluídos no referido programa tem sua exigibilidade suspensa.

          4. O disposto no art. 163 do CTN, que pressupõem a existência de débito tributário vencido para que se proceda a compensação, não é aplicável ao caso, pois o valor do débito tributário consolidado no REFIS, além de ter sua exigibilidade suspensa, será pago de acordo com o parcelamento estipulado, sendo opção do contribuinte compensar os valores dos créditos tributários a serem restituídos em repetição de indébito, com os débitos tributários consolidados no Programa Refis.

          5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não-provido.”

          (STJ, Resp n.º 873.799, 2.ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/08/2008, D.J.E. de 26/08/2008 – Grifamos)

Pela pertinência temática, vale a transcrição de parte do Voto proferido pelo Ilmo. Ministro Relator no acórdão suso ementado, in literis:

          “(...)

          Esta Corte vem adotando entendimento no sentido de não ser possível que a Secretaria de Receita Federal proceda a compensação de ofício de valor a ser restituído ao contribuinte em repetição de indébito, com o valor do montante de débito tributário consolidado no Programa REFIS, visto que os débitos incluídos no referido programa tem sua exigibilidade suspensa.

          Precedente da 1.ª Turma:

          ‘TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO. PARCELAMENTO.

          (...)

          3. O débito tributário incluído no REFIS sujeita-se, necessariamente, a ter sua exigibilidade suspensa.

          4. Impossibilidade de o Fisco reter valores constantes no REFIS, não-vencidos, para serem liquidados em regime de compensação.

          (...)’

          (REsp 997397 / RS, Rel. Min. José Delgado, D.J. 17.03.2008)

          Ademais, o disposto no art. 163 do CTN, que pressupõem a existência de débito tributário vencido para que se proceda a compensação, não é aplicável ao caso, pois o valor do débito tributário consolidado no REFIS, além de ter sua exigibilidade suspensa, será pago de acordo com o parcelamento estipulado, sendo opção do contribuinte compensar os valores dos créditos tributários a serem restituídos em repetição de indébito, com os débitos tributários consolidados no REFIS. (...)”

O Egrégio TRF 4.ª Região, através de jurisprudência consolidada em ambas as Turmas especializadas, vem reiteradamente decidindo na mesma esteira da jurisprudência da Corte Superior, sistematicamente condenando a Receita Federal do Brasil a abster-se de efetivar a retenção condicionada ao aceite da compensação de ofício com crédito deferido em Pedidos de Ressarcimento com débitos objeto de parcelamentos ou pendentes de decisões definitivas administrativas, in literis:

          “AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDOS DE RESSARCIMENTO. PRAZO PARA APRECIAÇÃO. LEI N° 11.457/2007. IN SRF N° 600/2005. IN SRF N° 629/2006. COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO. DÉBITOS ABRANGIDOS POR PARCELAMENTO. IMPOSSIBILIDADE.

          1. Os pleitos administrativos de ressarcimento de tributos encaminhados pelos contribuintes aos órgãos da administração fazendária não podem ficar parados aguardando solução indefinidamente, devendo ser fixado prazo razoável para a sua duração.

          2. In casu, aplicável as disposições do artigo 24 da Lei n° 11.457/2007, que fixou o prazo de 1 (um) ano para a análise do processo administrativo a contar do respectivo protocolo, com ressalva aos pleitos paralisados há mais de um ano, os quais devem ser analisados no prazo de 1 (um) mês.

          3. Os débitos porventura em aberto da empresa podem ser alvo da compensação, devendo a autoridade coatora abster-se de compensar os débitos abrangidos pelo parcelamento, desde que esteja sendo regularmente cumprido pelo contribuinte.

          4. Afastada a aplicação da IN 629/2006 e da IN 600/2005, de molde a evitar a compensação dos créditos tributários consolidados no parcelamento com créditos do contribuinte, até porque o ato administrativo mais recente sequer fala em débitos parcelados.

          5. Agravo de instrumento parcialmente provido tão-somente para fixar o prazo para apreciação dos recursos administrativos de ressarcimento nos termos do disposto no artigo 24 da Lei n° 11.427/2007.”

          (TRF 4.ª, AI n.º 2008.04.00.032299-3/RS, 1.ª Turma, Rel. Des. Federal Artur César de Souza, julgado em 05/11/2008, D.E. de 18/11/2008 – Grifamos)

          “TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO DE OFÍCIO. CRÉDITOS FISCAIS DO CONTRIBUINTE. DÉBITOS TRIBUTÁRIOS INCLUÍDOS EM PARCELAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PEDIDO ADMINISTRATIVO DE RESSARCIMENTO DE CRÉDITOS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. PROCRASTINAÇÃO INDEVIDA. PRAZO RAZOÁVEL PARA EXAME.

          1. Inviável a compensação de ofício de créditos fiscais do contribuinte com débitos tributários incluídos em parcelamento, porquanto o instituto em comento pressupõe a existência de créditos e débitos líquidos, certos e exigíveis.

          2. Na ausência de legislação específica sobre os prazos para a solução de processos administrativos relativos ao ressarcimento de créditos fiscais, aplicável, como parâmetro, a Lei nº 9.784/1999, que prevê o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por mais 30 (trinta), a contar do final da instrução (art. 49), bem como o prazo de 5 (cinco) dias para a prática de atos de impulsionamento processual (art. 24).

          3. Irreparável a sentença que, ante a inércia da Administração, fixou prazo razoável para que instrua e julgue os pedidos administrativos de ressarcimento de créditos formulados pelo contribuinte.

          4. Aos pedidos administrativos protocolados após a entrada em vigor da Lei nº 11.457/2007, aplica-se o art. 24 do diploma, que estabelece o prazo de 360 dias para a sua conclusão.”

          (TRF 4.ª, AMS n.º 2007.71.07.002736-4/RS, 2.ª Turma, Rel. Des. Federal Maria Helena Rau de Souza, julgado em 12/02/2008, D.E. de 27/02/2008 – Grifamos)

Verifica-se que a tônica nos julgados é sempre a mesma, afasta-se a aplicação da IN SRF n.º 600, de 2005, pois os débitos parcelados estão com a exigibilidade suspensa e devem ser quitados na forma como previsto no parcelamento, data venia, inaplicável o instituto da compensação de ofício por não se tratar de débitos vencidos ou exigíveis.

Ademais, o artigo 74, § 3.º, IV, da Lei n.º 9.430/96, com a redação dada pela Lei n.º 10.637/02, assevera que não poderão ser objeto de compensação os débitos consolidados em qualquer modalidade de parcelamento, sendo claro que a IN SRF n.º 600, de 2005 extrapolou os limites legais, pois a compensação de ofício só pode ser feita com débitos vencidos e exigíveis do contribuinte.

Ainda, deve ser afastada a aplicação do artigo 34, § 1.º, a IN SRF n.º 600, de 2005, porque o ato administrativo mais recente (IN SRF/SRP n.º 629, de 2006) sequer fala em tal possibilidade relativo a hipótese de débitos parcelados.

Acaso seja compelido o contribuinte a aceitar a compensação de ofício sob pena de retenção do seu crédito até quitação do saldo parcelado ou decisão definitiva em processo administrativo pendente de julgamento, pode o mesmo ingressar em juízo a fim de reconhecer a ilegalidade de tal ato, condenando a autoridade coatora a liberar o crédito em seu favor.

Autor: Alexandre Roehrs Portinho (alexandre.portinho@terra.com.br)
Advogado e Contabilista, Especialista em Direito Tributário, Financeiro e Econômico pela UFRGS, sócio da HOMRICH PORTINHO ADVOCACIA EMPRESARIAL S.S. e consultor da GESTÃO TRIBUTÁRIA CONSULTORIA EMPRESARIAL LTDA.
http://lattes.cnpq.br/2429461568270567


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